domingo, 13 de fevereiro de 2011

Um Engano

A velhice apresenta características de vida, aparentemente, estranhas, das quais poderíamos, facilmente, desfazer a seguinte trova popular: “- A pipa do vovô não sobe mais!”. Tecer os fatos que comprovam o aniquilamento dessa proposição é o fito desta nota.

Certamente, poderíamos estar enganados naquilo que diz respeito à condição de vida de um indivíduo senil. E posso, agora, afirmar com ajuda de minhas emaranhadas letras que, a “pipa” do vovô, com um assegurado esforço, pode sim alçar vôo.

Aconteceu em um provinciano bairro de uma também provinciana cidade.

Sr. Nazário, que já portava por sobre os ombros os seus 86 anos, muito bem vividos por sinal, regrados à base de aventurescas práticas sexuais e sentimentos voluptuosos, habitava em uma singela casa com sua dedicada e primogênita filha, Jandira. Seu filo familiar era consideravelmente extenso, mas praticamente tudo sempre esteve a par de Jandira; Parruda, pacata, não apresentava um mínimo de ações revolucionárias, até então. Cumpria seus afazeres diários com total dedicação e amabilidade. Porém, levava em si algo muito incomum perante as donzelas de sua idade – 25 anos. Desde o falecimento de sua mãe, quando ainda não havia completado 10 anos de idade, esteve fadada a viver a vida no infinitivo, pois o que estava constantemente a fazer era: lavar, passar, cozinhar, arrumar, fraquejar...

Sr. Nazário era o oposto da filha, abominado por toda a vizinhança, adorava quando um trapo de bola, mais precisamente dos garotos que viviam a brincar na rua em fronte ao seu quintal, descia girolando em meio a sua propriedade. Maquiavelicamente, laçava mão ao seu afiadíssimo Canivete de Portela, e estraçalhava, impiedosamente, as humildes boletas. E o que mais lhe proporcionava prazer, não era em ver as bolinhas serem carcomidas por seu impiedoso Canivete, e sim observar os lacrimejantes olhos dos pobres diabos do outro lado da cerca, choramingando a perda do único instrumento lúdico do qual possuíam.

Mas as sandices de Sr. Nazário não pararam por aí, eis que chega o dia do qual irá, literalmente, “tirar” o atraso.

Certo dia, inspirada em certa passagem bíblica, Jandira se rebelou, e exigindo a sua parte na herança, se embrenhou por estas estradas-de-Deus-a-fora juntamente com o padeiro da esquina. Antes da partida, e depois de receber a devida fatia do testamento de seu pai, escreveu rispidamente uma carta, contando que já não mais agüentava aquela vida, as maluquices e manias do velho. Zarpou, então, em companhia do padeiro, em busca do “sonho” perfeito.

Como já era de se esperar, a família logo logo tratou de arrumar uma outra escrava, ou melhor, uma outra senhorinha que desse conta dos afazeres. Apareceu assim, como uma estrela cadente de amor e fornicação, Alzira. Desde quando Sr Nazário escorreu seus melentos olhos por sobre o “conteúdo” da jovem ninfa – uma mocinha de 21 anos, mestiça, sorriso de cristal, e um corpo, significativamente, muito similar a toda formosura de uma escultura grega, as veias do velho pululavam sob a pele, saltitantes e frenéticas. A novata, sabendo que se tratava de um indivíduo com mais de meio século de atraso físico, aceitou benevolamente o trampo; até então, achava que não apresentaria perigo.

Alzira, durante boa parte da semana, pausava na casa em companhia de Sr. Nazário. Geralmente em quartos separados. Um dia, alegando urina “solta”, e dizendo que não poderia passar toda a madrugada solitariamente agonizando por algo que a qualquer momento poderia ceder e vir a baixo, o velho, insistentemente, rogou a empregada para que dormisse junto a si. Alzira, obediente, fraquejou diante dos incessantes apelos do velho, e concordou em passar a noite junto a ele. No alto da madrugada, em meio à sonata dos grilos e de outros seres desgraciosos, Alzira, deitada ao chão sobre uma esteira, inquietou-se com um quase inaudito ruído. Imaginando que seria (e era) o velho, pois em se tratando do mal que estava a aniquilá-lo, o velho poderia, a qualquer momento, seguir até o mictório para atender ao pedido da bexiga que já não consegue controlar os esfíncteres e, consequentemente, reter o mijo.

Passou, e alguns minutos depois, Alzira foi pega certeiramente por um objeto resfriado diante do rosto. Num rompante, despertou em meio à ameaças e declamações de amor ao mesmo tempo. Não restavam dúvidas, o viço do velho havia aflorado de vez! E todo aquele frenesi se resumia a uma loucura sexual do velho para com Alzira. Em meio a socos, pontapés, arranhões, puxões de orelha, cabelos e gritos, Alzira jamais poderia imaginar o tamanho da força que se escondia por debaixo de toda daquela pele pregueada. O velho conseguia dominá-la com uma força surreal, parecia que naquele momento o espírito da libido lhe tivesse fornecendo quilos de guarnição para que saciasse toda a sua sede erótica.

É lógico que, como toda boa Matuta (com M maiúsculo), Alzira não se deixou levar por toda aquela situação, que não passava de uma simples caduquice de um octogenário já caduco.

No fim das contas, a ninfeta que exalava mórbidos desejos sexuais em Sr. Nazário, ergueu-se e, arremessando o velho a metros de distância, correu desesperadamente bairro abaixo.

Daí, na manhã seguinte, o velho foi encontrado morto depois de arrebentar a cabeça na quina do rodapé de seu quarto. Depois de sepultado, a única coisa que deixou ao mundo foi uma psicose assassina em Alzira. Consumida por aferradas lembranças, e retaliada de corpo e alma, desde então, ronda os mais indefesos asilos a corromper os famosos alvos de sua ânsia psicótica. Esperta, sabe se cuidar, e não avança um passo em falso hora nenhuma. Ninguém ainda obteve a esperteza de lhe por as mãos, e se tornou uma das bandidas mais procuradas pela polícia nacional (e futuramente, também ganhará fama internacional).

Nota de Utilidade Pública

E tu? Tens algum familiar do sexo masculino em asilos e casas de repouso? Se sim, tome cuidado e o leve para casa, pois, facilmente, ele poderá se tornar uma presa fácil através de toda a graciosidade de Alzira (a “corruptora” de velhos “indefesos”).

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