Eis o espetáculo do mundo. E
feliz é aquele que não se contenta. Vivemos em tempos arrepiantes. E tens o ano
de minha morte.
É certo que ao longo do tempo
vivi sob um véu de candentes expectativas quanto a tudo o que foi produzido por
mim, principalmente letras. Produzi e reproduzi estórias, contribuí pobremente
com a história, urdi fábulas, sonhos, notas. Mas não sei se tudo isto poderá
salvar minha incessante e pungente condição. Um escritor, como outros de meu
tempo, não pode se preocupar se deve adequar sua atividade de criação a todas
essas novas e bestiais teorias que se criam e nascem nas torres de marfim. Dane-se
Flaubert, que no intento de sua mágica produção artística, fez das tripas e
coração para encontrar o perfeito dicionário. Naturalmente os críticos não
darão braço a torcer. Querem impor uma escola, um grilhão. Logo eu que, escrupulosamente,
fugi e não paguei pelo que não queria.
Para nossos antepassados que
acreditavam no progresso, moral, inclusive; e para quem achava que abrir uma
escola equivalia fechar uma prisão, tragam-nos as famosas pesquisas de opinião,
que se escancarem as gavetas das estatísticas! E vejam que nem mesmo o
progresso, por um lado parasitário, proporcionou comodidade de vida a todos.
Fizeram da poesia, autêntica
madre da criação e enlevo das palavras, reduziram-na a um mero jogo de
caracteres programados num computador. Uma máquina que, provavelmente, está
mais constrangida que o próprio ser humano. Ora, jamais, eu, um autêntico
literaturiado, abandonarei minhas raízes primitivas.
Encanto-me pela forma, pelo poder
de achar a força da criação artística em meio a notória indiferença do mundo,
que nunca me pediu, sequer, um conto. Os sonhos, que dantes, sonhados por um
coletivo, estão relegados a um cárcere ao fundo da mente, sem possibilidades de
libertação. Ignoro qualquer tipo de aproximação com a verdade, mas não nego que
já ensaiei muitos encontros.
Que não assimilemos os nossos
inimigos, que não os transformemos numa espécie de obsessão, num Zahir. Que
possamos aprender, quando os têm, de suas astúcias, mas corre-se o risco,
sempre, de querer, primeiro, parecer, depois, ser igual a eles.
Quando o amor se torna algo
secundário na vida de um homem, este homem também tende a ser secundário. Não é
meu objetivo cantar o amor, não é para isto que venho. Os deuses nos deram a
morte, o sofrimento para que tenhamos algo para cantar. Todo o canto primário,
toda a pequena poesia nasce de uma tragédia, de uma desgraça, toda poesia é
metade fatalidade.
O tempo é senhor de conclusões.
Tiramos inúmeros significados, por mais imprecisos que nos pareçam, por via de
suas próprias amiúdes. O amor, relegado a mera estátua latina do Cupido, já não
promove grandes revoluções. Bata-nos perfumar a nuca e tudo está ganho.
Basta-nos por um pouco de vaidade e interesses no bolso e ganhamos o mundo.
Nosso pobre individualismo já nos
aterra. Cavam nossa fossa todos os dias. Caiam-se os céus, agarro-me ao
travesseiro por não querer levantar pela manhã. Descargas de niilismo caem-me
sobre a face. Mundo tracejado de insatisfações. Ninguém mais se sente
confortável em seu posto de trabalho, se é que algum dia se sentiu.
Morro e não busco motivos para
isto. E se alguém sobrevive a este mundo, é um milagre, e se cria de forma
mutilada. Esse é seu canto.
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