segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Adeus ao Amor



Eu irei dizer adeus ao amor
Nunca ninguém se importou se eu deveria morrer ou viver
De tempos em tempos a chance de amar passou por mim
E tudo que eu sei sobre o amor é como viver sem ele
Eu não posso ver onde procura-lo.

Então, fiz minha mente ver que eu precisava
viver minha vida sozinho.
E esse não é o caminho fácil.
Eu acho que sempre soube isso
Eu tenho que dar adeus ao amor.

Não existem amanhãs para este meu coração
Certamente o tempo ira esquecer essas memórias
E acharei em algum lugar um alguém em eu que possa acreditar
E que eu possa viver por alguma coisa que realmente vale a pena viver.

Todos esses anos as procuras falharam
Finalmente consegui que as procuras parassem
Dias solitários e vázios serão meus únicos amigos
Apartir deste dia eu esqueço que existe AMOR.
E eu irei em frente com minhas maiores forças.

O que é mentira no futuro é um mistério para todos nós
Ninguém pode prever se é bom a fortuna se ela nunca existiu
Talvez venha um tempo em que eu veja que estive errado
Mas por agora, essa é minha canção.

E agora é tempo de dizer adeus ao amor
Eu irei dizer adeus ao amor.


(The Carpenters - Goodbye To Love)
Imagem - Google Imagens

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Conhecendo a "Jequice"

Estudar em uma escola confessional pode ser sinônimo de inúmeros significados. Um deles é a instrução. Instrução essa, muito bem dada por sinal, com direto a iniciação de ritos e vida cristã. Tratando de um outro modo, aqui na escola em que estudo (confessional-católica-espanhola) já se viu de tudo e um pouco mais. Uma das figuras mais “cativantes” e estranhas desse lugar é o nosso diretor, possivelmente um padre que, no auge de sua frustração, foi designado a direcionar uma instituição e, juntamente, uma leva de jovens desvairados (salva raras exceções, e eu não estou nessas). Praticamente tudo é perfeito para esse padre, e quando tudo nos parece perfeito, até mesmo as pessoas que nos giram em volta, é sinal de que estamos submersos a uma cachoeira de “jequice”. E é exatamente o que se pode dizer do diretor; ele consegue ser mais jeca do que o próprio Jeca Tatu. Apresar de tudo é uma boa pessoa, e sempre nos quer bem (colocando-nos em insanas e desastrosas situações).

Hoje mesmo ele chegou ao ápice de toda a sua “jequice”. A nossa escola está sempre por receber ilustres e beneméritos convidados, provenientes dos mais diversos cantos do mundo (isso diz o porquê de nunca varrerem o nosso pátio, pois lá pisaram muitas “celebridades” e, por uma compaixão ou estima a nossa instituição, nos fizeram o favor de pisotear cada canto do lugar). O padre-diretor, todo complacente, conduziu até a nossa classe um grupo de folk-rok da Galícia. Com todo o seu meio metro de barriga, e afagando-a (para o deleite de seus truculentos braços), o padre me expôs a uma das situações mais ordinárias que passei na vida. O grupo de galegos era composto por quatro jovens e atraentes rapazes. Imediatamente, todo o feminismo da sala se aflorou e mais parecia que estavam a receber um espírito de luz em seus ventres. Já não era pra tanto, porque os moços eram tão atípicos aos nossos costumes que mais transparecia que estavam a fazer um mero e simples favor. De repente (e eu já estava estranhando o padre ainda não dar a sua típica demonstração de “jequice”), ele solta: “ E então, quem vai fazer A pergunta?”. Nesse instante eu vi emergir toda a minha vocação nos olhos dos que estavam em volta. Como se fossem peixes fora d’água a beliscarem com as pontas dos lábios algum vulto preso no ar, todos, insidiosamente, gritaram, ou melhor, berraram: “THIAGO, THIAGO, THIAGO!!”. Pavorosa demonstração de afeto. O meu belo e único nome mais parecia um doce mel que saltava dos olhos da virgem posta por cima da lousa. Quando me dei conta vi que todos esperavam por algum suspiro ou gracejo de minha parte, mas não dei o braço a torcer, não fiz a tão esperada pergunta. Mandei todos pro inferno e saí desesperadamente da sala em busca de um psiquiatra (Mentira). Somente abaixei a cabeça e murmurei que não havia de ser feita nenhuma consideração. Nesse momento eu já estava roxo e meu estômago se correndo com o ácido da vergonha. Até que, como uma fuinha sem cérebro, Andréa lança a patética pergunta do fundo da sala (seria melhor ela ter batido a cabeça na parede até que todo o seu sangue saísse pelo nariz): “¿Es la primera vez que visitan a Brasil¿”. Com uma cara de quem está mais perdido do que a Vanusa cantando o hino nacional, o galego do meio balança, simplistamente, a cabeça, num ato de afirmação. Como se já não bastasse todo o festival de frivolidade, o padre ainda me dá uma de íntimo dos rapazes, e começa a “dialogar” com eles em seu dialeto natal, o “jequês”. “Cês tão gostando daqui?”, “Como Cês se sente visitando um país tão bonito como este?”. Durante alguns minutos, ainda presenciei as indecisas caretas do grupo.

Terminado todo o estúpido momento, ao fim da aula, ainda dei uma vasculhada pelos corredores do colégio pra ver se ainda encontrava um rastro dos moços. Mas toda a minha busca foi em vão, pois já deveriam estar de partida a uma hora daquelas, se despedindo do país em algum trecho desse espaçoso céu e a bater as chinelas para não levarem consigo nenhuma partícula de poeira que lhes pusessem em contato com a “jequice”.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

A Nós [Talvez]

Antes, eu pensava que tudo era passageiro, tudo poderia ir e vir sem nem um mínimo de compreensão e saudades. A partir do momento em que descobri a minha própria razão, e acreditei que jamais poderia dominar as exigências da minha mente, encontrei-me extorquido por esse sentimento derivado não sei bem de onde.

Quando menino, eu possuía um diário, e, ordinariamente, pelejava por sobre aquela superfície límpida de papel contando e ditando todas as suposições a cerca de mim mesmo. Verdadeiramente, lidava com isso como que se aquele pedaço de papelão encadernado por uma haste de arame fosse um amigo especial.

Por muito tempo pedi ao tempo um tempo. Um tempo para pensar e refletir a cerca de coisas banais cravadas, pelo próprio tempo, em minha pele. Eu negava, insistentemente, todas as ladainhas alheias, os ditos que lançavam-me à face. Fui interpelado inúmeras vezes: “os teus pés não se retorcem com os bafejos do inverno?”. E restava-me apenas olhar o céu e perceber o quão distante o sol brilhava, o quão distante se encontrava o arco-íris da misericórdia afetiva. Até que a fantasia da vida ludibriou-me a mente e conduziu a tua figura até o meu (então imperfeito) mundo. E juntos, descobrimos o segredo e, por várias vezes, tocamos as estrelas, mesmo já padecidas no firmamento. Em vários instantes, realizei incontáveis orações, e, no fim, sempre enxergava a retribuição – enviada pelos anjos, de cada uma. Nem passava por minha cabeça retroagir ao tempo em que sofri aguardando algo que, no romper da manhã, me veio das nuvens. Negava esse tempo, tentei, inutilmente, anulá-lo de minhas impressões. Estive tão apaixonado que não me importava se estivéssemos perto ou longe, sabia confiar em minha alma que lhe guardava como uma moeda no fundo do meu bolso. E acreditamos que havia sim um paraíso nesta dramática terra, e se encontrava justamente em nós, em nossos abraços. Eu conseguia armazenar toda a luz da lua em seus olhos. Esse olhar rebelde, revolucionário; modificou as doutrinas do meu coração.

Hoje, não entendo o que o mundo intencionava transmitir com toda aquela profícua(?) representação, tão passageira como um piscar de olhos. Ingratidão?

E por essas noites a minha cama sempre se transforma em um cais sem nem ao menos dar-me a possibilidade de idealizar uma ponta de esperança. E me pergunto: alguém irá abrir a porta? Inútil, sucumbido ao estranho movimento do meu labirinto hipotético, permaneço cerrado em meu arquétipo ideal de amar. Pensava em estar por toda a eternidade, confortavelmente, acolhido em nossa colméia de sentimentos – divinizada, especialmente, por nós e para nós. Agora me diga, valeu a pena? Sempre me dizia que não seria fácil, mas o que é fácil?

E hoje só encontro auxílio nas canções que me deixaste; poderá ser a única chance e a única via de nutrir o canteiro – de flores já mirradas – de um indolente? Uma canção de amor é aquilo que se vai como o próprio amor, como as ondas do mar; impetuosas e ofegantes; e através de suas caldas amargas prenderam-me, sufocaram-me por tudo o que há de mais sufocante no mundo. É um misto de lamento e compadecimento, é um tornado que gira em torno do meu atual meio de viver. E quem me dera avistar uma barca, me prender a sua proa e, definitivamente, ser conduzido à ilha do desespero.

Nesse instante, há uma fonte em meus olhos, não seca, não se apaga. Brota contínuas pedras luminosas e transparentes por causa de um futuro que não mais uso no presente.

É um velho e risonho engano perder-se à deriva com a maré. Porém, o preço que me exigiram é muito alto, e o caixa forte da minha existência não dispõe de tamanha reserva.

Por isso, fico bem, permaneço só... [Talvez]

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Nota

Definitivamente, sou compassivo a vozes. E, às vezes, nós, tangíveis as vozes, somos submetidos a certas situações que, na realidade, não apresentam um fundo de racionalidade.

Semana passada, uma tia veio a falecer. Recebemos a notícia como se estivéssemos aguardando um desfile mega espetacular de uma certa escola de samba. O telefone, estridentemente, tocou. Como se fosse um infeliz presságio, prima Erenice atendeu. Estávamos todos em casa, mais precisamente no lugar em que cismam dizer que é o melhor lugar, o lugar mais santo e comunal, a cozinha. Como o telefone estava posto na sala, prima Erenice regressou a cozinha como que se lhe tivessem sugado todo o sangue à canudinho, gota por gota. Ficamos todos apreensivos com tamanha palidez, eu, num determinado momento, acreditei que, acidentalmente, Erenice havia ingerido uma garrafa de Leite de Magnésia, mas não o era. Era a morte apenas.

Quase todos se derreteram num afamado pranto, não porque fosse a tia Carmem (a falecida) muito querida, não, mas a forma de como “fechou a casaca” nos pareceu muito trivial, morreu engasgada com uma espinha de traíra.

Após todo o leigo ritual dos pêsames coletivo, eu era o único que não havia se alarmado e nem se encontrava com o nariz similar a uma pimenta malagueta em ponto de colheita. Não porque eu seja uma pessoa turrona ou incompreensível, mas porque sou seco. O meu fluído lacrimal é composto por substâncias que não veem à tona por qualquer banalidade. Pois sim, a morte é uma banalidade. Seguindo todo o clima de combustão veloresca, havia de se fazer aquilo que devia de ser feito, ou seja, enroupar a defunta, ornamentar o velório e avisar os desavisados. Eu, mais precisamente, fui incumbido de realizar a última tarefa, pois era a que mais requisitava uma atitude hermética e cautelosa. Bem, nem ao menos deram-me a oportunidade de por em prática toda a minha experiência de auditor das notas de falecimento da cidade. Acredito, que toda essa minha sensibilidade por vozes teve inicio bem aí. Quando, em todas as manhãs de sábados – isso mesmo, aqui as pessoas adoram morrer, justamente, no sábado, aquela austera e penosa voz, despertava-me. Sempre com o mesmo padecido bordão: - “É com muito pesar que comunicamos o falecimento do Senhor Fulano...”. E o travesseiro servia-me de aterro aos meus ouvidos, e abafava um pouco daquela insidiosa voz.

Assim, escreveram-me um bilhetinho, um recadinho, bobo bobo... Que até mesmo aqueles que mais temem a morte conseguiriam fazê-lo de olhos semi encerrados.

No conteúdo, cravaram assim: “- Querido (nome do parente ao qual iria comunicar o falecimento) venho através, comunicar o falecimento da tia Carmem, o enterro acontecerá na hora tal, no cemitério tal... aguardamos pesarosamente a tua presença.” E eu tive que me submeter a esse vexame. Aguardar, como se estivéssemos aguardando para o coquetel da certeza mais paradoxal do mundo.

Mas o pior ocorreu no momento em que iniciei, para todo o congênere, as devidas ligações; e ao findar de cada comunicado – o fazia como se fosse uma boneca de pilha que ao receber um abraço se retorce e diz: “eu te amo!”, ouvia choramingos e o telefone do interlocutor se espatifar no chão. Isso fez-me pensar o quanto as pessoas são sentimentais à morte, pode ser até mesmo aquele vizinho que, grudado ao seu muro, num dia qualquer, vem a “empacotar”, e todos se apavoram e dizem: “Nossa, ele não merecia!”, ou então, (independente da idade) “Como era novo, não merecia morrer!” Como se fosse destinado a ser preservado no relicário da vida ou virar semente.

No fim, o velório foi um sucesso, pois até mesmo os vizinhos se compadeceram e tomaram a frente do acontecimento. Ajudaram a ornamentar, fizeram quitutes, café, chá... Parecia até mesmo uma festa de confraternização no Palácio de Buckingham, sendo que a rainha dessa “festa” também possuía uma coroa, granulada por fitas vermelhas e maços de galhos secos – isso só para não dizer que pelo menos uma vez na vida, ou melhor, na morte, tia Carmem não parecesse com a Rainha Elizabeth II.

Passado todo o cerimonial litúrgico e os ritos profanos, chegou-se a hora do desmantelado momento da alcovação. Particularmente, detesto cemitérios, eles não deveriam existir, se existem é por conta da inóspita mania humana em guardar coisas velhas e ultrapassadas. Mas, por um lado, confesso, tenho certa queda por esses sítios, apesar de todo o meu lado convulsivo os detestar. Pois são nesses lugares é que melhor consigo acalmar toda esta minha depravada sensibilidade por vozes. É um lugar neutro, são. Não se escuta nada, ou melhor, será que não escutamos realmente? Ou os sepultados querem nos dizer algo e, por contarmos com uma audição tão definhada, não teríamos capacidade ouví-los? Sei lá.

Enfim, o enterro foi feito e, assim, todos seguiram para casa com a cabeça desnivelada. Já parecia que o sol estava por sair – pois na hora do sepultamento, o céu se escondia por sobre intrujadas nuvens.

Por mais, sigo até hoje sensível a vozes, tendo, às vezes, que renunciar a certos acontecimentos em minha vida. Sei que isto pode parecer uma infeliz comparação, ou seja, essa ambivalência entre morte e voz. Pode ser que, no outro mundo, quando eu estiver sendo conduzido por Hermes Trismegisto ao trono de Hades, não possa, definitivamente, livrar-me das “vozes”?

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Selo ''Projeto Creativité''


Bom, há dias atrás eu recebi esse selo de qualidade "Projeto Creativité" de Helena Reis (Helenina, pros mais íntimos), proprietária e manda chuva do blog "Gota de Limão" (ainda não conhece? hum.. num sabe o que tá perdendo.).

Como já é de costume, eu sou uma pessoa que adora quebrar correntes. Pois bem, não irei cumprir com as devidas regras, porque aqui quem determina as regras sou eu... mas, por detrás disso tudo, tenho um propósito. Na verdade, eu nem sei mais quem me lê, ou seja, quem vem e passa por aqui. Eu acho que nunca falei nada sobre mim, os meus textos falam por si só. Mas, pensei bem e aqui estou, pronto a expor esta horrenda cara que se esconde por detrás desta máscara infausta.

Então, só para manter a tradição irei dizer 10 coisinhas sobre a minha pessoa, nada demais, pra variar.

Nome: Thiago Campos Leite (Desabafo: gostaria que... quem inventou em colocar um "h" em "tiago" fosse queimar no mármore do inferno, pois é uma tremenda incomodidade ter que ouvir aquela perguntinha tão inpertinente toda vez que se tem de preencher algum formulário ou cadastro: "É T(h)iago com "h" ou sem "h"?).
Uma música: Não tenho uma, uma é infinitamente limitada para definir-me, então fico com a teoria de que: "todo prazer me diverte".

10 coisas sobre Io:

1- No momento tô querendo (é só no querer mesmo) me mudar para Portugal de mala e cuia.
2- Sou muito preciso. Penso muitas vezes antes que fazer algo, mas quando sou arrebatado é isso e ponto.
3- Tenho mania de organização, e só consigo trabalhar com o chão limpo.
4- Soy mui enamorado por toda la literatura Latino-americana.
5- Me decidi precipitadamente por um curso universitário, porém o castigo vem no rabo do coelho, e me arrependi muito. Mas agora estou enlouquecidamente satisfeito no qual me encontro matriculado atualmente.
6- Adoro ler à noite e, consequentemente, de madrugada, pois é o momento do qual disponho do mais sepulcral silêncio, sem gritaria e brigas da vizinhança.
7- Não faço amigos facilmente, tenho que rodar, rodar e rodar até encontrar o fio da meada.
8- Uma das tarefas mais difíceis de minha vida, creio, seria dizer qual é o meu livro preferido. Não sei a resposta. Todos os livros que eu li, durante essa "jovem" vida, acrescentaram, de certa forma, muitos pontos favoráveis que me fizeram ser o que hoje sou.
9- Atualmente estou em êxtase com toda a obra do escritor argentino Jorge Luis Borges (eu sou assim, tenho alguns períodos literários).
10- Não tenho preconceito com Best Sellers, inclusive, já fui um Sidney Sheldon maníaco (e o acho um dos escritores mais originais e intrigantes do mundo, me proporcionou momentos agradabilíssimos de leitura). Na verdade, todos os Best Sellers por mais que tenham de enfretar a sua parcela de preconceito, possuem os seus devidos valores. E digo mais, se hoje estou a ler escritores digamos... "refinados" foi, única e exclusivamente, por causa deles, ou seja, ninguém nasce sabendo.

Isso não é nem uma ínfima parcela daquilo que represento no mundo (não que eu seja grande coisa), mas eu me auto-considero...

Ah, e aproveitando para agradecer a todo mundo que acessa o blog, obrigado mesmo. Fico muito feliz quando vejo as estátiscas (ilusão pura, pois o google é burro e nem sabe contar). Mas, o que posso fazer? Vivo de ilusão.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

ARGUMENTUM ORNITHOLOGICUM

Fecho os olhos e vejo um bando de pássaros. A visão dura um segundo, talvez menos; não sei quantos pássaros vi. Era definido ou indefinido seu número? O problema envolve o da existência de Deus. Se Deus existe, o número é definido, porque Deus sabe quantos pássaros vi. Se Deus não existe, o número é indefinido, porque ninguém conseguiu fazer a conta. Neste caso, vi menos de dez pássaros (digamos) e mais de um, mas não vi nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três ou dois pássaros. Vi um número entre dez e um, que não é nove, oito, sete, seis, cinco, etcétera. Esse número inteiro é inconcebível; ergo, Deus existe.


(Jorge Luis Borges)
Obras completas de Jorge Luis Borges, volume 2 / Jorge Luis Borges. - São Paulo : Globo, 2000.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Um Engano

A velhice apresenta características de vida, aparentemente, estranhas, das quais poderíamos, facilmente, desfazer a seguinte trova popular: “- A pipa do vovô não sobe mais!”. Tecer os fatos que comprovam o aniquilamento dessa proposição é o fito desta nota.

Certamente, poderíamos estar enganados naquilo que diz respeito à condição de vida de um indivíduo senil. E posso, agora, afirmar com ajuda de minhas emaranhadas letras que, a “pipa” do vovô, com um assegurado esforço, pode sim alçar vôo.

Aconteceu em um provinciano bairro de uma também provinciana cidade.

Sr. Nazário, que já portava por sobre os ombros os seus 86 anos, muito bem vividos por sinal, regrados à base de aventurescas práticas sexuais e sentimentos voluptuosos, habitava em uma singela casa com sua dedicada e primogênita filha, Jandira. Seu filo familiar era consideravelmente extenso, mas praticamente tudo sempre esteve a par de Jandira; Parruda, pacata, não apresentava um mínimo de ações revolucionárias, até então. Cumpria seus afazeres diários com total dedicação e amabilidade. Porém, levava em si algo muito incomum perante as donzelas de sua idade – 25 anos. Desde o falecimento de sua mãe, quando ainda não havia completado 10 anos de idade, esteve fadada a viver a vida no infinitivo, pois o que estava constantemente a fazer era: lavar, passar, cozinhar, arrumar, fraquejar...

Sr. Nazário era o oposto da filha, abominado por toda a vizinhança, adorava quando um trapo de bola, mais precisamente dos garotos que viviam a brincar na rua em fronte ao seu quintal, descia girolando em meio a sua propriedade. Maquiavelicamente, laçava mão ao seu afiadíssimo Canivete de Portela, e estraçalhava, impiedosamente, as humildes boletas. E o que mais lhe proporcionava prazer, não era em ver as bolinhas serem carcomidas por seu impiedoso Canivete, e sim observar os lacrimejantes olhos dos pobres diabos do outro lado da cerca, choramingando a perda do único instrumento lúdico do qual possuíam.

Mas as sandices de Sr. Nazário não pararam por aí, eis que chega o dia do qual irá, literalmente, “tirar” o atraso.

Certo dia, inspirada em certa passagem bíblica, Jandira se rebelou, e exigindo a sua parte na herança, se embrenhou por estas estradas-de-Deus-a-fora juntamente com o padeiro da esquina. Antes da partida, e depois de receber a devida fatia do testamento de seu pai, escreveu rispidamente uma carta, contando que já não mais agüentava aquela vida, as maluquices e manias do velho. Zarpou, então, em companhia do padeiro, em busca do “sonho” perfeito.

Como já era de se esperar, a família logo logo tratou de arrumar uma outra escrava, ou melhor, uma outra senhorinha que desse conta dos afazeres. Apareceu assim, como uma estrela cadente de amor e fornicação, Alzira. Desde quando Sr Nazário escorreu seus melentos olhos por sobre o “conteúdo” da jovem ninfa – uma mocinha de 21 anos, mestiça, sorriso de cristal, e um corpo, significativamente, muito similar a toda formosura de uma escultura grega, as veias do velho pululavam sob a pele, saltitantes e frenéticas. A novata, sabendo que se tratava de um indivíduo com mais de meio século de atraso físico, aceitou benevolamente o trampo; até então, achava que não apresentaria perigo.

Alzira, durante boa parte da semana, pausava na casa em companhia de Sr. Nazário. Geralmente em quartos separados. Um dia, alegando urina “solta”, e dizendo que não poderia passar toda a madrugada solitariamente agonizando por algo que a qualquer momento poderia ceder e vir a baixo, o velho, insistentemente, rogou a empregada para que dormisse junto a si. Alzira, obediente, fraquejou diante dos incessantes apelos do velho, e concordou em passar a noite junto a ele. No alto da madrugada, em meio à sonata dos grilos e de outros seres desgraciosos, Alzira, deitada ao chão sobre uma esteira, inquietou-se com um quase inaudito ruído. Imaginando que seria (e era) o velho, pois em se tratando do mal que estava a aniquilá-lo, o velho poderia, a qualquer momento, seguir até o mictório para atender ao pedido da bexiga que já não consegue controlar os esfíncteres e, consequentemente, reter o mijo.

Passou, e alguns minutos depois, Alzira foi pega certeiramente por um objeto resfriado diante do rosto. Num rompante, despertou em meio à ameaças e declamações de amor ao mesmo tempo. Não restavam dúvidas, o viço do velho havia aflorado de vez! E todo aquele frenesi se resumia a uma loucura sexual do velho para com Alzira. Em meio a socos, pontapés, arranhões, puxões de orelha, cabelos e gritos, Alzira jamais poderia imaginar o tamanho da força que se escondia por debaixo de toda daquela pele pregueada. O velho conseguia dominá-la com uma força surreal, parecia que naquele momento o espírito da libido lhe tivesse fornecendo quilos de guarnição para que saciasse toda a sua sede erótica.

É lógico que, como toda boa Matuta (com M maiúsculo), Alzira não se deixou levar por toda aquela situação, que não passava de uma simples caduquice de um octogenário já caduco.

No fim das contas, a ninfeta que exalava mórbidos desejos sexuais em Sr. Nazário, ergueu-se e, arremessando o velho a metros de distância, correu desesperadamente bairro abaixo.

Daí, na manhã seguinte, o velho foi encontrado morto depois de arrebentar a cabeça na quina do rodapé de seu quarto. Depois de sepultado, a única coisa que deixou ao mundo foi uma psicose assassina em Alzira. Consumida por aferradas lembranças, e retaliada de corpo e alma, desde então, ronda os mais indefesos asilos a corromper os famosos alvos de sua ânsia psicótica. Esperta, sabe se cuidar, e não avança um passo em falso hora nenhuma. Ninguém ainda obteve a esperteza de lhe por as mãos, e se tornou uma das bandidas mais procuradas pela polícia nacional (e futuramente, também ganhará fama internacional).

Nota de Utilidade Pública

E tu? Tens algum familiar do sexo masculino em asilos e casas de repouso? Se sim, tome cuidado e o leve para casa, pois, facilmente, ele poderá se tornar uma presa fácil através de toda a graciosidade de Alzira (a “corruptora” de velhos “indefesos”).

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Eu Preciso Estar Apaixonado



A coisa mais difícil que fiz é continuar a crer
Que existe alguém neste mundo maluco por mim
Do modo como as pessoas vêm e vão em vidas tão passageiras
Minha oportunidade poderia surgir e eu talvez nem soubesse.


Eu costumava dizer: "sem promessas", vamos manter tudo bem simples
Mas a liberdade só lhe ajuda a dizer adeus
Levou algum tempo para eu aprender que nada se leva de graça
O preço que paguei é suficiente para mim.

Sei que preciso amar alguém
Sei que desperdicei tempo demais
Sei que estou exigindo perfeição de um mundo por demais imperfeito
Sou tolo o suficiente para pensar que é o que encontrarei.


Portanto, aqui estou com bolsos cheios de boas intenções
Mas nenhuma delas vai me consolar esta noite
Estou bem acordado às quatro da manhã, sem um amigo à vista
Estou abandonado, mas está tudo bem comigo...


(The Carpenters - I Need To Be In Love)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Os Espelhos Velados

O Islã assevera que, no dia inapelável do Juízo, todo perpetrador da imagem de uma coisa viva ressuscitará com suas obras, e lhe será ordenado que as anime, e ele fracassará, e será entregue com ela ao fogo do castigo. Quando menino, conheci esse horror a uma duplicação ou multiplicação espectral da realidade, mas diante dos grandes espelhos. Seu infalível e contínuo funcionamento, sua perseguição de meus atos, sua pantomima cósmica eram então sobrenaturais, desde que anoitecia. Um de meus instantes rogos a Deus e a meu anjo da guarda era o de não sonhar com espelhos. Sei que os vigiava com inquietude. Algumas vezes temi que começassem a divergir da realidade; outras, ver neles meu rosto desfigurado por adversidades estranhas. Soube que esse temor está, outra vez, prodigiosamente no mundo. A história é muito simples. E desagradável.
Em mil novecentos e vinte e sete, conheci uma jovem sombria: primeiro por telefone (porque Júlia começou sendo uma voz sem nome e sem rosto); depois, em uma esquina ao entardecer. Tinha os olhos assustadoramente grandes, os cabelos negros e escorridos, o corpo estrito. Era neta e bisneta de federalistas, como eu de unitários, e essa antiga discórdia de nossos sangues era para nós um vínculo, uma melhor posse da pátria. Vivia com os seus em um desmantelado casarão de teto altíssimo, no ressentimento e na insipidez da decência pobre. De tarde – raras vezes de noite – saíamos para caminhar por seu bairro, que era o de Balvanera. Margeávamos o paredão da estrada de ferro; pela Sarmiento certa vez fomos até as clareiras do Parque Centenario. Entre nós não houve amor nem ficção de amor: eu adivinhava nela uma intensidade que era totalmente estranha à erótica, e a temia. É comum contar às mulheres, para estabelecer intimidade, traços verdadeiros ou apócrifos do passado pueril; devo ter-lhe falado dos espelhos e sugeri, assim, em 1928, uma alucinação que floresceria em 1931. Agora, acabo de saber que ela enlouqueceu e que em seu quarto os espelhos estão velados, porque neles vê meu reflexo, usurpando o seu, e treme e se cala e diz que eu a persigo magicamente.
Infausta servidão a de minha face, a de uma de minhas antigas faces. Esse odioso destino de minhas feições tem que me tornar odioso também, mas já não me importa.
(Jorge Luis Borges)
Obras completas de Jorge Luis Borges, volume 2 / Jorge Luis Borges. - São Paulo : Globo, 2OOO.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Aversão

Havia um tempo em que uma terrível carga aracnofóbica circundava todas as minhas ações e movimentos. Caminhava periciando tudo e todos. Esta tremenda fobia por aranhas começou bem cedo, lá nos meus oito anos de idade. Reza minha mãe que, deitado tranquilamente sobre a cama, batizado por Morfeu, nem imaginava que esta petulante criatura, com as patas veludosas e o corpo cabeludo, poderia estar a alguns centímetros de meus pés. Quando mamãe se deu conta, o bicho já estava se apossando de meu esquio corpo. Um estrépito grito acudiu-me, e quando me vi, estava por sobre a pele uma colossal e monstruosa tarântula. A partir de então, não mais passei noites em sossego, e não mais consegui me livrar de tamanho medo. Estava presente em tudo. Um dos piores momentos, acredito, era na escola, mais precisamente as aulas de Biologia Anatômica. Professor Gervázio, de um corpo e voz tão estranhos quanto o nome, venerava incessantemente aquele insípio laboratório que tanto me aterrorizava. Na verdade, todos idolatravam o lugar, menos eu. Os meus colegas, vidrados diante dos potes que resguardavam disformes e pavorosos animais de todos os filos e raças, caprichosamente, adoravam estar ali. Eu sempre me mantinha longe e secreto, sem conversas e amostras, pois somente um escorrer de olhar por aqueles recipientes, e o meu sangue já logo esguichava assombramento e depressão. O curioso foi o modo de como esta tenebrosa fobia se esvaiu, assim mesmo como chegou.

Num fim de tarde, sentado por sobre uma cadeira de balanço em minha sala de estar e lendo mais uma edição de “Verdade no Asfalto”, avisto por entre o vão da porta uma aranha. Ela, por sinal, era enormemente pré-histórica e, carregava na dianteira, uma imensa anca. Não suei frio como de costume, somente senti um pequeno pavor, e por alguns minutos o meu coração palpitou desaceleradamente. Eis que me surgi uma idéia, fantástica por sinal. Resolvo que já era hora de acabar com toda aquela frescuragem – pensando nos varões da família que, possivelmente, estavam a desencadear um frenético rebuliço em suas covas, conclui: “Chega disso! Esse bicho é só mais um a andar por sobre o mundo, assim como outros bilhões.”. Cismei, então, em brincar com o meu algoz. E brinquei.

Desci até a dispensa e lancei mão a uma vassoura, regressando a sala, ela ainda permanecia lá, imóvel e intacta. Fiz com que seguisse um itinerário estranho e atordoado. Ela andava de um lado para o outro apoiada pela vassoura. Da sala passou pra cozinha, da cozinha pro banheiro, do banheiro pra sala, e, assim, retornamos a cozinha novamente. Quando lhe dei um instante de descanso, percebi que já não mais estava sóbria como antes; intermitente, seguia trôpega por entre os ladrilhos. Diabolicamente, pensei: “farei com que fique ainda mais bêbada do que já está, e pagará pelos males de sua raça” - todos esses anos de prisão psicológica e paranóicas manias entorno deste propósito inútil. Calmamente, fui até ao armário, mirei a garrafa de álcool. Voltando a presença do desvalido animal, que naquele momento era ilustre, fardei todo o seu pestilento corpo com o líquido da garrafa. Rapidamente, ela, inquietante, resolve traçar seu próprio caminho, eu a deixei seguir em frente. Pobre, nunca imaginei que diria isso um dia, mas tive pena. Conseguiu avançar poucos passos através daquela sincronia mórbida de patas pegajosas. Findou-se ali mesmo a vida de mais uma aracnídea da face da Terra. Sucumbida, fardada ao desespero de ser mais um ser sem razão pelo mundo, não fazia idéia do que lhe arrastara até ali.

O melhor de tudo, não foi a morte da aranha, que foi morta, velada e sepultada, mas foi o findo de minha fobia. – poderá até os defensores dos animais a denunciarem-me aos órgãos competentes, mas, sei que estou com a consciência limpa, e cumpriria minha pena sem remorsos. Pois matei uma aranha, e sou um assassino de animais e de fobias. E isso me pareceu um choque terrível que eletrizava cada partícula do meu sangue, parecia-me que estavam a dissecar todo o terror e angustia sentidos desde o início dessa louca e desvairada repugnância. A partir daquele dia, não mais temi as aranhas e a nenhum outro bicho. Mas, como toda partida deixa marcas e mágoas, permaneço entristecido por não mais uma aranha se atrever a visitar minha humilde residência. Creio ter sido convertido a uma espécie de Basilisco, com um olhar negro e venenoso. Por um lado, fico um pouco estranho com esta sensação de não mais poder brincar com esse tipo de animal tão peçonhento e aniquilador do medo. Parece-me que o feitiço virou contra o feiticeiro, e, agora, existe mais uma fobia a ser incluída na lista da CID da qual compete a aracnologia, thiagonofobia.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Graças à Vida



Graças à vida que me deu tanto
Me deu dois olhos que quando os abro
Distinguo perfeitamente o preto do branco
E no alto céu seu fundo estrelado
E nas multidões a mulher que eu amo

Graças à vida que me deu tanto
Me deu o ouvido que em todo seu comprimento
Grava noite e dia grilos e canários
Martírios, turbinas, latidos, aguaceiros
E a voz tão terna de minha bem amada

Graças à vida que me deu tanto
Me deu o som e o abecedário
Com ele, as palavras que penso e declaro
Mãe, amigo, irmão
E luz iluminando a rota da alma da que estou amando

Graças à vida que me deu tanto
Me deu a marcha de meus pés cansados
Com eles andei cidades e charcos
Praias e desertos, montanhas e planícies
E a casa sua, sua rua e seu pátio

Graças à vida que me deu tanto
Me deu o coração que agita seu marco
Quando olho o fruto do cérebro humano
Quando olho o bom tão longe do mal
Quando olho o fundo de seus olhos claros

Graças à vida que me deu tanto
Me deu o riso e me deu o pranto
Assim eu distinguo fortuna de quebranto
Os dois materiais que formam meu canto
E o canto de vocês que é o mesmo canto
E o canto de todos que é meu próprio canto

Graças à vida, graças à vida


(Violeta Parra - Gracias a la Vida)
Imagem - Google Imagens